30/06/2016 Empresa inovadora faz pecuarista lucrar mais sem desmatar na Amazônia

Empresa inovadora faz pecuarista lucrar mais sem desmatar na Amazônia

Rebanho num dos lotes de pastagem com a floresta ao fundo.
Foto:
Divulgação Pecsa.

A Pecuária Sustentável da Amazônia assume a gestão de fazendas degradadas, recupera as florestas e faz o negócio dar mais dinheiro

 

A solução para o desmatamento na Amazônia parece fazer sentido financeiro. É possível produzir sem cortar mais floresta, mostra um volume cada vez maior de pesquisas. Estudos e simulações indicam que dá para criar mais bois por hectare, com técnicas melhores, conservando as áreas de preservação permanente, a reserva legal de floresta e evitando novos desmatamentos. E que, além de evitar complicações com órgãos ambientais, essa prática ainda rende bons resultados financeiros e mantém a produtividade da fazenda por mais tempo. Fica a pergunta: se é tão bom assim, por que então os produtores rurais da região não se modernizam? Para responder a essa questão, um grupo de pesquisadores decidiu passar para o lado dos negócios. Eles largaram uma das principais ONGs da região e abriram uma empresa que gerencia as fazendas, com boas práticas ambientais e bom manejo do gado. O resultado tem sido tão promissor que a empreitada agora está se expandindo.

 

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Essa é a história da Pecuária Sustentável da Amazônia (Pecsa), uma empresa que carrega a semente de uma revolução na região. A aventura começou quando o grupo de pesquisadores da ONG mato-grossense Instituto Centro de Vida (ICV) fazia um programa-piloto para avaliar o desempenho econômico de fazendas bem manejadas em Mato Grosso. Vando Telles, Laurent Micol, Vagner Telles, Fabiano Alvim e Felipe Bicalho têm formações de administração de empresas e zootecnia. Entre 2011 e 2015, como pesquisadores do ICV, eles estudaram dez áreas que faziam parte de fazendas maiores no município de Alta Floresta. O programa mostrou que cuidar melhor do gado e da floresta permitia aumentar a receita da atividade.

 

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Com esses resultados na mão, o grupo teve a inspiração de levar aquele conhecimento para a prática dos negócios. Eles captaram € 11,5 milhões no fim de 2015 com um fundo de investimento de impacto, o Althelia Climate Fund, baseado em Londres. Além de olhar para o resultado financeiro, os investidores do fundo querem resultados sociais e ambientais. Com o recurso do Althelia, os pesquisadores criaram a Pecsa e se capitalizaram para investir em recuperação das fazendas de pecuária. 

 

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“No geral, criar a Pecsa foi um passo bastante natural para todos os cinco fundadores, cada um dentro de seu contexto particular”, conta Laurent Micol, um criadores da empresa e diretor de governança e investimentos. “Não foi encarado como sair de um ambiente supostamente seguro da ONG para se arriscar no mundo dos negócios, e mais como a nova etapa de um processo de empreendedorismo socioambiental.”

A primeira meta foi buscar fazendas no total de 10.000 hectares. Os seis candidatos vieram das experiências-piloto em Alta Floresta. A Pecsa se associou às seis fazendas para administrá-las e recuperar o passivo ambiental, modernizando a criação. Cada contrato é diferente. Mas o princípio geral é que a Pecsa assume a gestão da fazenda por um período de seis a sete anos.

 

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O produtor entra com o empréstimo da terra, das instalações existentes e do gado que estiver lá. A Pecsa entra com conhecimento técnico e arca com todo o investimento em melhorias. “Nesse tempo, nós estamos no comando”, diz Laurent. “O produtor pode ou não continuar morando na propriedade. Ele fica aprendendo as novidades”, diz. Enquanto a Pecsa está operando a fazenda, o proprietário tem uma participação no resultado da receita anual. “Geralmente essa participação é mais do que ele ganhava antes sozinho”, diz Laurent. No final do período, a Pecsa devolve a fazenda ao proprietário com todas as benfeitorias e as novas técnicas de gestão.

 

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Bebedouro para o gado. Com o suprimento de água, os bois não pisoteiam as margens dos rios (Foto: Divulgação - Pecsa)

 


É um investimento pesado em melhorias. A Pecsa cerca a área de pastagem, para separar da reserva legal e das áreas de proteção permanente. Também reforma a pastagem, colocando um capim de melhor qualidade. Divide a área em lotes, para fazer uma rotação do gado. Dessa forma, os bois ficam um tempo comendo capim novo, depois vão para outro lote enquanto o pasto se recupera. Os bois também passam a se alimentar de suplementos. A Pecsa também constrói um sistema de captação e estocagem de água e bebedouros em cada lote com pasto. Dessa forma, os bois não precisam ir até a beira dos riachos. Ajuda a recuperar a mata das margens dos rios e nascentes. Ajuda na saúde dos bois, que bebem água mais limpa e não têm doenças derivadas da lama acumulada nas patas. A Pecsa ainda por cima faz o replantio da vegetação nas áreas de preservação permanente danificadas (como as margens dos rios) e da reserva legal devida (na Amazônia, é preciso conservar floresta em 80% de cada propriedade).


O custo é mais pesado no início. Segundo Laurent, o investimento é da ordem de R$ 7 mil por hectare em reforma de pastagem e aquisição de gado, mais cerca de R$ 1.500 de custeio. Segundo ele, a recuperação do passivo ambiental custa em torno de 5% do investimento total. “Muitos produtores dizem que recuperar a dívida ambiental é impagável. Mas, quando modernizamos a fazenda inteira, esse custo é absorvido pelo investimento total”, diz.

Os resultados chegam. Primeiro, a capacidade da fazenda aumenta. “Quando nós pegamos a fazenda, com os pastos degradados, ela sustenta cerca de 1,2 cabeça de gado por hectare. Conseguimos fazer chegar a três ou quatro cabeças por hectare”, diz. Com isso, a fazenda já passa a produzir mais sem expandir a área ocupada. Além disso, a produtividade também aumenta porque os bois amadurecem mais rápido para o abate. Os gado ganha peso mais rápido, por causa da rotação do pasto, do suplemento alimentar e dos cuidados de higiene. “Antes, a idade do abate era 3 anos para fêmeas e 4 anos para machos. Agora, chegamos a 2 anos para fêmeas e 2,5 para machos”, diz Laurent.

As finanças também evoluem com as melhores práticas. Segundo Laurent, a margem de lucro bruta típica da pecuária na Amazônia é de R$ 200 por hectare. Isso é a diferença entre a receita e o custo, sem contar os impostos e a depreciação da fazenda. Durante a fase de piloto no ICV, o grupo chegou a um retorno de R$ 600 por hectare. Hoje, com a Pecsa, operando em áreas maiores, conseguem R$ 1.000 por hectare. “Isso é compatível com a margem dos cultivos de soja”, diz.

Resultados assim foram vistos pelo fazendeiro Milton Paulista. Nascido em Botucatu, no interior de São Paulo, foi um dos pioneiros de Alta Floresta há 26 anos. “Os militares estimularam a gente a vir para cá para ocupar a região”, lembra. “A orientação era tacar fogo na mata e abrir pastagens”, diz.  Mas com o tempo as fazendas se degradaram. O capim estava cheio de praga. O gado não engordava fácil. Milton passou o comando da fazenda para a Pecsa em 2015 e continuou morando nela. Hoje ganha 12% do lucro da fazenda sem nem um centavo de despesa. “O patrimônio já cresceu. Desde que comecei a parceira, a fazenda já vale o dobro do que antes”, diz.

Se Milton mora dentro da fazenda, os sócios de outra propriedade gerida pela Pecsa enfrentam a distância para manter o olho do dono em cima das terras. O fazendeiro Jânio Machado mora em Franca, no interior de São Paulo. Ele é um dos sócios de uma fazenda em Paranaíta, no norte de Mato Grosso. Os outros sócios também moram longe da fazenda. Três são de Franca também e um mora nas Bahamas. A situação é típica de fazendas de gado na Amazônia. “Eu visito a fazenda duas vezes por ano. É difícil administrar à distância”, diz Jânio. O grupo comprou terras na Amazônia como investimento em 2010. Mas logo eles descobriram a complexidade de criar gado no Norte do Brasil. “Você pode contratar zootecnista, agrônomo, veterinário. Chamar vários especialistas. Mas ninguém tem a visão do todo necessária para a fazenda funcionar do melhor jeito”, afirma.


Com a chegada da Pecsa, a fazenda de Jânio mudou. Os técnicos tiraram os tocos de árvores do pasto. Isso permitiu usar máquinas para adubar a terra. Assim como no caso da fazenda de Milton, dividiram o pasto, trocaram o capim e instalaram bebedores para o gado não pisotear as margens dos rios. A fazenda tinha 1.300 cabeças de gado. Hoje tem o dobro, podendo triplicar no período chuvoso, de outubro a junho. “Antes, só gastávamos. Não tínhamos resultado líquido. Mal pagávamos as contas”, diz Jânio. “Agora a fazenda rende um dinheirinho.” E não dá dor de cabeça com os órgãos ambientais, afirma.


Agora, a Pecsa se prepara para mais um passo. “A gente provou que funciona como técnica e como negócio”, diz Laurent. O desafio é ganhar escala para mostrar como a pecuária sustentável é uma opção para a Amazônia, competindo com vantagem com as práticas predatórias. O próximo objetivo é uma nova rodada de fazendas somando 100.000 hectares. “O desafio é captar mais recursos”, afirma. Na região de Alta Floresta, não faltam fazendeiros interessados. “Quando começamos com a Pecsa, os vizinhos ficaram desconfiados. Agora, vendo os resultados, querem também”, diz Jânio. “O que pesa muito é a satisfação de fazer algo que o deixa entusiasmado com o futuro”, diz.

 

Recuperação de áreas de preservação permanente (Foto: Divulgação - Pecsa)

Fonte: ÉPOCA | Blog do Planeta.




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